23.05.19 | Notícias

Pode o condomínio proibir a locação de imóveis pelo AIRBNB?

Muitas questões envolvendo as locações pelo sistema de 'compartilhamento de imóveis', como é o caso do ARIBNB e de outros sites, carecem de uma resolução jurídica precisa, quadro que dificilmente será modificado caso o projeto de lei 784/2005 – o qual tramita no Senado e visa a regular a matéria – venha a ser aprovado (sobre o tema, clique aqui). Do mesmo modo, ainda são incipientes a regulamentação legislação das questões tributárias relacionadas ao tema (é o caso do Município da Caldas Novas – para saber mais, clique aqui).

No entanto, os problemas envolvendo condomínios e proprietários de imóveis que pretendem alugá-los por meio de sistemas de locação 'online' têm sido cada vez mais crescentes. Apesar de ser ainda pequena a judicialização da matéria, a tendência é que ela cresça exponencialmente nos próximos meses, o que certamente deverá gerar ainda mais problemas: diante da falta de legislação sobre o tema, a tendência é que as soluções oferecidas pelo Poder Judiciárias sejam eivadas de um alto grau de subjetividade e que surjam decisões em sentidos diametralmente opostos.

O exemplo mais atual, nesse sentido, é o da proibição – pelos condôminos – de que proprietários de imóveis possam alugá-los utilizado plataformas como é o caso das conhecidas AIRBNB e Booking. As poucas decisões a respeito do assunto apontam uma multiplicidade de entendimentos, sendo muitos deles bastante discutíveis. Aqui, trataremos das três principais posições a respeito da matéria:

1 - De modo bastante rigoroso, alguns juízes têm entendido que o simples fato de a convenção do condomínio dispor que as unidades autônomas possuem destinação residencial (previsão que, por sinal, já é uma exigência legal) seria suficiente para que o condomínio, mediante decisão da assembleia geral de condôminos, pudesse vedar a locação (TJSP:  :Apelação Cível 1060720-14.2017.8.26.0100: Relator: :Milton Carvalho: Órgão Julgador: 36ª Câmara de Direito Privado: Foro Central Cível - :16ª Vara Cível: Data do Julgamento: 19/03/2019). Esse entendimento parte do pressuposto de que não estaríamos diante de uma simples locação para temporada, mas, sim, do exercício de atividade com finalidade característica de hotelaria ou hospedaria, o que desnaturaria a utilização do imóvel para fins residenciais. Nesse sentido, inclusive, há quem entenda que o único meio para admitir a locação das unidades autônomas diante dessa situação seria a alteração da convenção de condomínio, fazendo nela constar a possibilidade de utilização de tais unidades para fins não residenciais (TJSP: voto divergente do Desembargador Pedro Baccarat no julgamento da apelação cível n.º 1002697-72.2018.8.26.0704).

2 - Entendimento um pouco menos extremo, mas também vocacionado a impedir a locação pelo ARIBNB, é o de que somente com a alteração da convenção de condomínio seria possível tal vedação. Desse modo, a mera decisão da assembleia de condôminos no sentido de proibir a locação, de delimitar sua duração ou mesmo de restringir o acesso dos locatários às áreas de uso comum seriam viciadas. O único caminho para o estabelecimento de tais restrições seriam, portanto, a modificação da convenção, o que pressupõe um quórum de 2/3 dos condôminos, nos termos do art. 1.351 di Código Civil. Em suma, por se tratar de limitação ao exercício do direito de propriedade, a interpretação extensiva – no sentido de conceber que a convenção restringe a locação pelo simples fato de prever destinação residencial às unidades autônomas – seria descabida, de modo que a referida restrição deveria ser expressa. (TJSP: Apelação Cível 1002697-72.2018.8.26.0704: Relator: :Milton Carvalho: Órgão Julgador: 36ª Câmara de Direito Privado: Foro Regional XV - Butantã - :2ª Vara Cível: Data do Julgamento: 21/02/2019. No mesmo sentido, ver TJSP: Agravo de Instrumento 2224345-22.2017.8.26.0000: Rel. Jayme Queiroz Lopes: 36ª Câmara de Direito Privado: j. 23/03/2018).

3 – Por fim, há o entendimento de que 'a locação por temporada por meio do site airbnb que não desnatura a utilização da unidade condominial com destinação residencial' (TJSP:  :Apelação Cível 1117942-37.2017.8.26.0100: Relator (a): :Claudio Hamilton: Órgão Julgador: 25ª Câmara de Direito Privado: Foro Central Cível - :23ª Vara Cível: Data do Julgamento: 16/05/2019: Data de Registro: 20/05/2019). Desse modo, seria descabido impor tal restrição aos proprietários da unidade autônoma ainda que por meio da convenção de condomínio.

Na verdade, restrições ao direito de propriedade que desbordam das previsões legais afiguram-se, em tese, inconstitucionais, por violarem o art. 5.º, XXII, da Constituição Federal. Mas não é só isso. No tocante ao tema do condomínio edilício, o art. 1.335, I, do Código Civil estabelece que são direitos do condômino 'usar, fruir e livremente dispor das suas unidades', vale dizer, exercer todos os poderes inerentes ao direito de propriedade (art. 1.228 do Código Civil). O regime condominial justifica restrições ao direito de propriedade? Eventualmente, sim. Porém, tais restrições quando existentes devem ser impostas pela lei, como é o caso da proibição – salvo autorização pela convenção – da locação de abrigos de veículos para pessoas estranhas ao condomínio (art. 1331, §1.º, CC). Dito de outro modo, a regra é o livre exercício do direito de propriedade: a exceção, a sua limitação, que, como se verifica no caso da locação dos abrigos de veículo, decorre da lei, e não de uma decisão da assembleia condominial ou da própria convenção.

Por sinal, mesmo que se considerasse que a natureza jurídica da locação por meio do Booking ou AIRBNB não seja a da locação por temporada, mas, sim, de uma atividade comercial, para tanto seria necessário analisar a situação concreta. O morador que eventualmente aluga o seu imóvel estaria dando a ele destinação não-residencial do mesmo modo como um investidor que adquire o imóvel unicamente para alugá-lo por curtos períodos? E se esse mesmo investidor alugasse o imóvel por períodos maiores, isso significaria uma destinação 'mais residencial' que nas hipóteses de locações pelo AIRBNB? O proprietário que aluga o seu imóvel na praia, durante o verão, estaria violando a convenção do condomínio? Quais os critérios para se afirmar que a locação por determinado período modificaria a destinação residencial do imóvel? Existem critérios para tanto?

Ao que tudo indica, a locação da unidade autônoma (independentemente do meio utilizado), por si só, não desnatura a sua destinação. A questão reside em saber como será utilizado o imóvel pelo respectivo locatário.

Ao invés de vedar o exercício do direito de propriedade, o mais prudente é que os condomínios estabeleçam regras para conferir maior segurança a todos, exigindo que o locador comunique previamente os dados das pessoas que ocuparam o seu imóvel, advertindo os locatários a respeito das regras estabelecidas pelo condomínio, e que fique sujeito, se for o caso, às penalidades decorrentes do descumprimento dessas regras.

Para mais informações, estamos à disposição no contato@raatzanchieta.com.br


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