27.01.15 | Notícias
Corretor tem direito à comissão ainda que ocorra a desistência da transação imobiliária
A corretagem de imóveis é disciplinada pela Lei 6.530/78 e pelo Código Civil brasileiro (artigos 722-729). Trata-se de contrato que se caracteriza pela 'atividade intermediatriz entre pessoas que desejam contratar, ou praticar para outrem algum ato' (PONTES DE MIRANDA, Tratado de direito privado, vol. 43, p. 333). Nesse sentido, o Código Civil vem a defini-lo como contrato em que uma pessoa, não ligada a outra em virtude de mandato, de prestação de serviços ou por qualquer relação de dependência, obriga-se a obter para a segunda um ou mais negócios, conforme as instruções recebidas. Claro está que o contrato de corretagem não se confunde com o contrato de mandato, nem com o contrato de prestação de serviços, embora a eles, em certos aspectos, se assemelhe. O seu cerne está na mediação e aproximação de pessoas, a fim de colocá-las em acordo quanto a celebração do negócio jurídico de compra e venda imobiliária.
O Superior Tribunal de Justiça tem evoluído no trato da matéria, de modo a reconhecer, em determinados casos, o direito do corretor ao recebimento de comissão, ainda que ocorra a desistência da transação imobiliária, para a qual ele aproximou o comitente (vendedor) e o terceiro (comprador). Tal entendimento, sufragado no julgamento do recurso especial n.º 1.339.642-RJ, tem respaldo no artigo 725 do Código Civil, segundo o qual 'a remuneração é devida ao corretor uma vez que tenha conseguido o resultado previsto no contrato de mediação, ou ainda que este não se efetive em virtude de arrependimento das partes'.
No caso mencionado, as partes haviam celebrado contrato de promessa de compra e venda, tendo a compradora efetuado o pagamento de R$ 400.000,00 a título de sinal. Posteriormente, no entanto, a adquirente enviou termo de distrato à vendedora, alegando a inviabilidade técnica do empreendimento que seria realizado no terreno objeto do contrato. E, segundo a ministra Nancy Andrighi, relatora no recurso especial em questão, o direito do corretor ao recebimento da respectiva comissão depende da reflexão acerca do que pode ser considerado resultado útil, a partir do trabalho de mediação do corretor.
Tendo ocorrido a mediação e a aproximação de pessoas, com certeza, não consuma-se a atividade de corretagem. Daí a doutrina afirmar o seu caráter aleatório, na medida em que há um risco que lhe é inerente: 'o corretor aceita a probabilidade de não alcançar um resultado em seu trabalho. A realização definitiva do fim colimado depende mais de outras circunstâncias alheias à sua vontade, subordinando-se à decisão da pessoa que estabelece as condições' (RIZZARDO, Contratos, p. 782). Porém, obtido o acordo de vontades entre as partes em face da atividade de mediação e aproximação exercida pelo corretor, perfectibilizada está o resultado para o qual se propôs. E, desse modo, devida será a remuneração.
A questão nodal para o enfrentamento da matéria – bem apreendida, por sinal, no julgamento proferido pelo STJ – está no caráter dinâmico e complexo da compra e venda imobiliária, o que pode ser bem visualizado tendo como pano de fundo as lições de Clóvis do Couto e Silva, no clássico 'A Obrigação como Processo'. É que o processo obrigacional pode ser desmembrado em planos distintos – os quais podem ser mais perceptíveis em alguns casos – como os planos do nascimento e desenvolvimento e o plano do adimplemento. Em se tratando da compra e venda imobiliária existem as fases de negociação, de celebração de contrato de promessa de compra e venda ou de pagamento de arras, de celebração do contrato definitivo por forma pública quando for o caso, e, por fim, de transmissão da propriedade junto ao registro imobiliário.
Visualizada a questão sob esse ângulo, fica claro que o direito à comissão é devido pelo corretor mesmo que não ocorra o adimplemento definitivo da obrigação assumida pelo comprador ou pelo vendedor. Vale dizer, seu direito decorre do nascimento da obrigação entre comprador e vendedor, não ficando adstrito ao plano do adimplemento do negócio jurídico. Acertadamente, o STJ entendeu que 'o corretor deve aproximar as partes até o ponto de obter consenso quanto aos elementos essenciais do negócio', de modo que 'a mediação deve corresponder somente aos limites conclusivos do negócio, mediante acordo de vontade entre as partes, independentemente da execução do próprio negócio'. Assim, 'a inadimplência das partes, após a conclusão do negócio, mesmo que se desenvolva em rescisão, não repercutirá na pessoa do corretor'.
Sob tal perspectiva, pode-se interpretar o art. 725 do Código Civil. Com efeito, em se tratando de corretagem imobiliária, deve-se entender por resultado previsto no contrato de mediação, a celebração de qualquer espécie de negócio jurídico, decorrente da aproximação e mediação realizada pelo corretor, do qual seja possível concluir o acordo de vontade tendente à transmissão da propriedade imobiliária, ainda que tal negócio jurídico, por si só, não tenha o condão da transmiti-la, como na hipótese da celebração de promessa de compra e venda ou da prestação de arras confirmatória.
Raatz &: Anchieta Advocacia.