30.01.15 | Notícias

Conhecendo a Alienação Fiduciária Imobiliária

A alienação fiduciária é um instrumento jurídico bastante comum na compra e venda imobiliária. Conhecê-la é essencial tanto para aqueles que atuam no ramo imobiliário, quanto para quem pretende adquirir um imóvel financiado.

O instituto em questão foi criado pela Lei 9.514/97, que institui o Sistema Financeiro Imobiliário – SFI, podendo ser contratado por pessoa física ou jurídica, não sendo privativo das entidades que operam no SFI (art. 22, §1.º, Lei 9.514/97). É importante lembrar que o SFI tem por finalidade promover o financiamento imobiliário em geral, não se confundindo, pois, com o Sistema Financeiro da Habitação – SFH, o qual, conforme a sua própria lei instituidora e como o próprio nome diz, tem como objetivo facilitar a aquisição da casa própria. Não trataremos aqui das diferenças entre os dois sistemas, embora elas, de fato existam, e sejam bastante significativas, especialmente no que diz respeito à fonte de recursos para o financiamento e na existência de maiores restrições e regulação no âmbito do SFH.

A alienação fiduciária insere-se na classe dos direitos reais de garantia, não obstante apresente peculiaridades que lhe diferem, por exemplo, da hipoteca, espécie de garantia bastante utilizada no SFH. Enquanto na hipoteca o proprietário do imóvel limita o seu próprio direito de propriedade, ao constituir sobre ele e em favor do credor uma garantia real, na alienação fiduciária o devedor deixa de ser proprietário, transferindo, portanto, a titularidade do direito de propriedade ao credor, com o objetivo de garantir uma obrigação. Nesse sentido, suponha-se que alguém pretende adquirir um imóvel cujo valor seja R$ 500.00,00, mas dispõe somente de R$ 200.000,00. Para financiar o valor restante, irá celebrar um contrato de mútuo com um banco, adquirindo, assim, a propriedade plena no imóvel. No entanto, para garantir a dívida contraída, o devedor, também chamado fiduciante, irá transferir a propriedade resolúvel da coisa ao credor, nominado fiduciário. Disso, verifica-se que a alienação fiduciária é um contrato acessório daquele do qual decorre o crédito que a propriedade fiduciária visa a garantir.

Conceito chave para compreender a alienação fiduciária é o de propriedade resolúvel. Propriedade resolúvel é uma propriedade sob condição resolutiva, vale dizer, que nasce para ser desfeita caso implementada a referida condição. Assim, uma vez pago o valor da dívida garantida pela alienação fiduciária, a propriedade resolúvel, transferida ao credor, se desfaz, de modo que o devedor torna-se proprietário pleno da coisa (art. 25, Lei 9.514/97). No, entanto, se não houver o pagamento da dívida, consolida-se a propriedade plena em favor do credor fiduciário.

Para a celebração do contrato de alienação fiduciária de bens imóveis, é necessário que conste, no instrumento, o valor da dívida, o prazo e as condições de reposição do empréstimo ou do crédito fiduciário, a taxa de juros e os encargos, a cláusula de constituição da propriedade fiduciária, com a descrição do imóvel objeto da alienação fiduciária e a indicação do título e modo de aquisição, cláusula assegurando ao fiduciante, enquanto adimplente, a livre utilização, por sua conta e risco, do imóvel, a indicação, para efeito de venda e leilão, do valor do imóvel e dos critérios para sua respectiva revisão, bem como cláusula dispondo sobre os procedimentos para a venda do bem, no caso de inadimplemento. Questão interessante é a possibilidade aberta pelo art. 38 da Lei 9.514/97 para que os contratos por ela referidos – dentre os quais se inclui a alienação fiduciária – possam ser celebrados por escritura pública ou por instrumento particular de escritura pública. Desse modo, aí estaria uma exceção à regra do art. 108 do Código Civil, que prescreve a forma pública, como requisito de validade, de negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.

Com a celebração do contrato, apesar de transferida a propriedade resolúvel ao credor fiduciário, o devedor fiduciante permanecerá com a posse direta do bem, podendo, livremente, usar, gozar e fruir do bem. Além disso, com a anuência expressa do credor, poderá transmitir os direitos de que seja titular sobre o imóvel objeto da alienação fiduciária em garantia, assumindo o adquirente as respectivas obrigações (art. 29, Lei 9.514/97). Assiste ao devedor, portanto, o direito de dispor do bem, embora o seu exercício esteja subordinado à concordância do credor.

Para finalizar esta breve apresentação do instituto da alienação fiduciária, cabe fazer algumas considerações sobre os efeitos do não pagamento do financiamento pelo devedor e o procedimento para consolidação da propriedade em favor do credor e para a alienação do bem. Com efeito, salvo quando estipulado prazo de carência, após o não pagamento de qualquer prestação, o credor poderá requerer ao oficial do Registro de Imóveis que intime o devedor para satisfazer a prestação vencida e as que vencerem até a data do pagamento. Diante desse quadro, abrem-se duas possibilidades: (i) o devedor paga as prestações vencidas e demais encargos, purgando a mora, o que importará na manutenção da vigência do contrato (art. 26, § 5º, Lei 9.514/97), ou (ii) em não ocorrendo a purga da mora, o oficial do Registro de Imóveis certificará tal fato, e diante do pagamento do imposto de transmissão inter vivos pelo credor, promoverá a averbação, na matrícula do imóvel, da consolidação da propriedade. Após tal fato, o credor deverá, no prazo de 30 dias, promover leilão público para a venda do imóvel. Não se admite que o credor fiduciário fique com o bem em face da dívida, pois isso desnaturaria a função de garantia da alienação. Tal hipótese é admitida somente se o próprio devedor, após o inadimplemento, der em pagamento da dívida os seus direitos sobre o imóvel (art. 26, §8.º, Lei 9.514/97).

Não é necessária a realização de nova avaliação do imóvel para que seja realizado o leilão, uma vez que o seu valor para tal finalidade, bem como os respectivos critérios de revisão, são elementos essenciais do contrato de alienação fiduciária. Se, no primeiro leilão, o maior lance oferecido for inferior a tal valor, será realizado, nos quinze dias seguintes, novo leilão, no qual será aceito o maior lance oferecido, desde que igual ou superior ao valor da dívida, das despesas, dos prêmios de seguro e dos encargos legais e da cota condominial. Nos cinco dias que se seguirem à venda do imóvel, o credor entregará ao devedor o montante remanescente, nele considerando-se compreendido o valor da indenização por benfeitorias, depois de deduzidos os valores da dívida e das demais despesas decorrentes do procedimento para intimação do devedor e venda do bem. Não se admite, a retenção de benfeitorias pelo devedor.

Note-se que tal procedimento dispensa qualquer participação do Poder Judiciário. Somente na hipótese de o imóvel ser vendido e o devedor, ainda assim, nele permanecer, é que será necessária a propositura de ação de imissão de posse pelo adquirente (a Lei 9.514/97 menciona, equivocadamente, o termo reintegração de posse), o qual terá direito à concessão de liminar para que ocorra a desocupação no prazo de sessenta dias, bastando para tanto a comprovação da consolidação da propriedade plena (Lei 9.514/97, art. 30).

Como se pode perceber, a alienação fiduciária imobiliária demanda muita atenção por partes dos adquirentes de imóveis, na medida em que oferece um procedimento bastante célere para a satisfação do credor fiduciário. No entanto, sua agilidade é, por outro lado, um mecanismo importantíssimo para impulsionar a concessão do crédito com melhores taxas e, consequentemente, o desenvolvimento do mercado imobiliário.

Raatz &: Anchieta Advocacia.Direito Imobiliário. Alienação Fiduciária. SFI. SFH.Canoas-RS.


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